AS PROMESSAS ARMAMENTISTAS DE BOLSONARO
- elisaromeraf
- 21 de jun. de 2024
- 4 min de leitura
Conheça o que o presidente da república tem feito até o momento e como isso impacta na sociedade brasileira.
Por Elisa Romera de Freitas
“Esse nosso decreto não é um projeto de segurança pública. É, no nosso entendimento, algo até mais importante que isso. É um direito individual daquele que porventura queira ter uma arma de fogo ou buscar a posse de uma arma de fogo, seja um direito dele…”
A frase foi dita pelo presidente Jair Bolsonaro em seu primeiro ano de mandato, 2019, após assinar um decreto que regulamenta a lei Lei nº 10.826, de 22 de dezembro de 2003, que diz respeito ao porte e à posse de armas no Brasil.
A pauta não é novidade. O ex-militar promete, desde sua campanha eleitoral, realizar ações favoráveis à posse de armas no Brasil. E, durante seu governo, cumpriu esse posicionamento.
Sua ação mais recente ocorreu no dia 12 de fevereiro deste ano, contando com a assinatura de quatro decretos que têm o fim de enfraquecer o Estatuto do Desarmamento, lei criada em 2003.
Essas mudanças, invariavelmente, são de relevância para todos os brasileiros, pois carregam, além de um grande viés ideológico, drásticas alterações para a vida de forma coletiva. Mas afinal, na prática, o que são esses decretos?
AS AÇÕES DE BOLSONARO
Bolsonaro foi um dos presidentes com o maior número de decretos promulgados, ficando atrás somente de Fernando Collor. Apenas 15 dias após assumir o governo, o presidente já havia assinado o seu primeiro, sendo este, pautado na questão do armamento.
Imputando diversas mudanças drásticas no consumo de armas, o chefe do Executivo aumentou deliberadamente o número de armas permitidas por indivíduo, assim como a quantidade de munição.
Nos decretos mais recentes, substituindo as determinações publicadas em 2019, houve o aumento de 4 para 6 do número limite de armas por pessoa e a duplicação da quantidade de munições permitidas para consumo anual, que passou a ser 2000.
Em entrevista ao Podcast “O Assunto”, a renomada jornalista Sônia Bridi, explica que, com o atual cenário de permissões armamentistas, o suspeito do assassinato de Marielle Franco, o miliciano Adriano Magalhães da Nobrega, poderia, legalmente, adquirir seu arsenal, constituído por 20 carabínas.
Nessa situação, seria necessário traficar apenas o chamado “kit rajada”, que permite a automatização das armas.
Essa realidade seria impossível pela legislação do Estatuto do Desarmamento, segundo a jornalista. Para ela, quando comparados à importância de uma legislação, os decretos e portarias de Bolsonaro perdem a força e, portanto, deveriam ser revogados.
Com um pensamento semelhante ao de Sônia Bridi, o advogado e assessor da Conectas, em entrevista à própria organização, Jefferson Nascimento, comenta:
“Temos um presidente que parece estar disposto a tudo para fazer valer sua vontade e seus interesses pessoais, mesmo que para isso precise atropelar o processo legislativo, os ritos democráticos e colocar em risco a seguranças das pessoas”.
HÁ SEGURANÇA NO ARMAMENTO?
Atribuir maior segurança a uma população armada é um tópico amplamente discutido globalmente devido aos diversos pontos de vista pelos quais pode ser analisado.
No Brasil, um fato inquestionável é que, após o estabelecimento do Estatuto do Desarmamento, em 2003, o crescimento da violência sofreu uma evidente desaceleração.
Um exemplo disso é exposto no informe internacional “Reductions In Firearm-Related Mortality And Hospitalizations In Brazil After Gun Control”, redigido por Maria de Fátima Marinho de Souza, James Macinko, Airlane Pereira Alencar, Deborah Carvalho Malta, e Otaliba Libânio de Morais Neto, todos grandes acadêmicos internacionais.
O estudo demonstra que, apenas um ano depois do estatuto ser estabelecido, pela primeira vez em mais de uma década, houve um declínio de 8% na quantidade de mortes relacionadas a tiroteios. O mesmo ocorreu com a quantidade de hospitalizações que, por esse motivo, caíram em 4,6% se comparadas a 2003.
“O impacto estimado dessas medidas, se provadas causais, poderiam evitar mais de 5.563 mortes relacionadas a armas de fogo apenas em 2004” (tradução livre), assegura o informe.
Por outro lado, Bolsonaro cotidianamente dispara frases como “a segurança pública começa dentro de casa”, ignorando as tendências positivas proporcionadas pela legislação de restrição armamentista.
Afirmando que sua postura é democrática, novamente coloca a posse de armas como uma defesa do cidadão. Para ele, retirar o poder arsenal da população é coisa de ditador: “o povo armado jamais será escravizado”, discursou o presidente.
Uma coisa também é certa, os donos de armas realmente se sentem mais seguros independente da veracidade de sua eficiência em defendê-los. Em uma matéria do Uol, chamada “Ter uma arma de fogo é a melhor forma de se defender? EUA buscam respostas”, o professor de Stanford, John J. Donohue, exemplifica a situação ao relatar o caso das mães de dois atiradores, um da escola Sandy Hook (2012) e o outro da Universidade Comunitária Umpqua (2015).
“Tinham um grande arsenal em casa que, pensavam, as protegeria de ameaças. Mas a lição é que normalmente há pouca ligação entre o que as pessoas acreditam passionalmente sobre armas e a verdade”, explica o acadêmico.
CONHEÇA AS VERDADEIRAS VÍTIMAS
Dentre questionamentos quanto às vantagens e desvantagens do armamento, uma coisa é certa: medidas que concedem a um determinado grupo de pessoas uma força exclusiva, acabam por marginalizar os mais fracos.
Nesse caso, os adolescentes pertencem ao grupo de risco. No artigo “Adolescências feridas: retrato das violências com arma de fogo notificadas no Brasil” é discutido, justamente, a vulnerabilidade causada pela violência carregada nas armas de fogo.
Assim, o estudo entende que a situação ocorre com uma incidência tão significante que pode ser caracterizado enquanto um grave problema de saúde pública. Em determinado trecho, explicita-se que: “Registraram-se 30.103 notificações de violências com armas de fogo em adolescentes, sendo 74,7% no sexo masculino de 15 a 19 anos (83,8%). Entre as meninas, a violência é mais comum na residência, com agressor conhecido e violência física e sexual combinadas”.
Como apontado pelo artigo, o caso das mulheres também é um tópico sensível a políticas favoráveis a armas de fogo. Por serem naturalmente vítimas de violência doméstica, armar seus agressores poderia, na realidade, significar um perigo ainda maior.
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